ENCONTRO INESPERADO
O meu primeiro contato com a vida no campo foi quando fiquei tuberculoso.
Na época o tratamento para tuberculose era penicilina e o ar do campo. Não foi tão ruim. A penicilina veio na forma de duas injeções diárias durante um mes - inesquecíveis. A preparação já era um tortura. Ferver a seringa de injeção e uma agulha, muitas vezes rombuda, numa caixinha de metal (é crianças, o descartável não existia) e a gente olhando, esperando a hora da picada fatal. Já o ar do campo veio com a mudança de toda minha familia para a serra pelotense, onde haviamos alugado a casa de um colono. Era uma espécie de turismo rural, muito comum na década de 40 e 50. Esta foi a parte boa. As ameixas roxas e brancas colhidas diretamente no pé. Nunca mais encontrei tão doces e suculentas. O riacho de água corrente no meio do mato, nem 20 cm de profundidade, mas era precioso. O leite direto da vaca turbinado com uma medida de Toddy. As correrias pelo campo atras de uma bola ou sem propósito nenhum. Nem lembro que idade eu tinha mas devia ter passado dos dez anos pois lembro uma visita de meus tios, a irmã de minha mãe e seu marido, ele um sobrevivente de uma tuberculose que lhe liquidou um pulmão inteiro. Acho que veio me prestar sua solidariedade que eu ingratamente retribui tentando levar a filha dele, minha prima, para um passeio cheio de intenções pela mata nativa. O irmão dela porém, alguns anos mais moço, mas muito bem instruido, permaneceu grudado na mana e não permitiu que nada de grave acontecesse.
Estas lembranças vieram a tona quando vi um filme que o Cineman me recomendou - Encontro Inesperado. O nome em frances é muito mais sonoro - Une Hirondelle a Fait Le Printemps. Em tradução livre - Uma andorinha só faz o verão. Uma inteligente variação do conhecido provérbio.
A história é o cruzamento de duas vidas.
Sandrine é uma parisiense, livre e desimpedida, professora de uma escola de informática, bom salário, apartamento, carro e.. de saco cheio com a vida. Resolve ser agricultora e começa a fazer um treinamento para jovens que desejam encarar esta dura atividade. Dois anos de treinamento. Um ano teórico e um ano prático estagiando em propriedades rurais. Uma idéia boa para os nossos sem terra que, sem nenhum conhecimento de agricultura, são jogados num pedaço de terra para viver, indefinidamente, a custas de ranchos fornecidos por nós.
Na outra ponta da história temos o velho agricultor Adrien (Michel Serrault). Com Adrien é o contrário, não suporta mais a vida do campo. Adrien coloca sua propriedade a venda. É um pequeno sitio, nos Alpes, onde ele cria umas quarenta cabras produtoras de leite. Quando Sandrine aparece como compradora ele coloca a condição de continuar morando ali por seis meses. Ela aceita e está montado o cenário da história.
São dois solitários que aos poucos vão se conhecendo e se gostando. Sandrine talvez procurando o pai que não tem e Adrien, a mulher que perdeu. O filme é lento, bem ao estilo francês, mas com continuidade e muita emoção. A paisagem dos Alpes é um espetáculo a parte.
Considero como um filme que deve ser visto. É daqueles que deixam algo agradável na gente depois que se assiste.
Até a próxima postagem.
Obs. Vocês notaram que minha tradução livre cita o provérbio na versão portuguesa que é diferente da versão francesa. As estações são diferentes - primavera (printemps) na francesa e verão na portuguesa. Colecionei a mesma expressão em diversas línguas - vejam que interessante.
Português: Uma andorinha só não faz verão.
Espanhol: Una golondrina sola no hace verano.
Italiano: Una rondine no fa primavera.
Francês: Une hirondelle ne fait pas le printemps.
E a original em latim: Una hirundo no facit ver.
Um simples provérbio nos permite traçar os vôos migratórios das andorinhas na Europa - chegando na primavera na França e na Itália, e no verão na Peninsula Ibérica - e mais ainda, imaginar Julius Caesar, num momento romântico, as margens do Nilo, sussurando para Cleopatra "- Una hirundo no facit ver". Aqui, recentemente, Tiririca, usou o provérbio na construção da desculpa futura.
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